Após um tempo de férias, voltemos com a tag curta o curta com "A Maior Flor do Mundo" (2007), curta baseado no livro infantil de mesmo nome do escritor José Saramago. E nada melhor do que trazer algumas palavras escritas por ele para apresentar-lhes esse curta:
"Aí pelos começos dos anos 70, quando eu ainda não passava de um
escritor principiante, um editor de Lisboa teve a insólita ideia de me
pedir que escrevesse um conto para crianças. Não estava eu nada certo de
poder desobrigar-me dignamente da encomenda, por isso, além da história
de uma flor que estava a morrer à míngua de uma gota de água, fui-me
curando em saúde pondo o narrador a desculpar-se por não saber escrever
histórias para a gente miúda, a quem, por outro lado, diplomaticamente,
convidava a reescrever com as suas próprias palavras a história que eu
lhes contava. O filho pequeno de uma amiga minha, a quem tive o
desplante de oferecer o livrinho, confirmou sem piedade a minha
suspeita: “Realmente”, disse à mãe, “ele não sabe escrever histórias
para crianças”. Aguentei o golpe e tentei não pensar mais naquela
frustrada tentativa de vir a reunir-me com os irmãos Grimm no paraíso
dos contos infantis. Passou o tempo, escrevi outros livros que tiveram
melhor sorte, e um dia recebo uma chamada telefónica do meu editor
Zeferino Coelho a comunicar-me que estava a pensar em reeditar o meu
conto para crianças. Disse-lhe que devia haver um engano, porque eu
nunca tinha escrito nada para crianças. Quer dizer, havia esquecido
totalmente o infausto acontecimento. Mas, há que dizê-lo, foi assim que
começou a segunda vida de “A maior flor do mundo”, agora com a bênção
das extraordinárias colagens que João Caetano fez para a nova edição e
que contribuíram de maneira definitiva para o seu êxito. Milhares de
novas histórias (milhares, sim, não exagero) foram escritas nas escolas
primárias de Portugal, Espanha e meio mundo, milhares de versões em que
milhares de crianças demonstraram a sua capacidade criadora, não só como
pequenos narradores, também como incipientes ilustradores. Afinal, o
filho da minha amiga não tivera razão, o conto, de transparente
simplicidade, havia encontrado os seus leitores. Mas as coisas não
ficaram por aqui. Há alguns anos, Juan Pablo Etcheverry e Chelo
Loureiro, que vivem na Galiza e trabalham em cinema, procuraram-me com o
objectivo de fazer da “Flor” uma animação em plasticina, para a qual
Emilio Aragón já tinha composto uma bela música. Pareceu-me interessante
a ideia, dei-lhes a autorização que pediam e, passado o tempo
necessário, inútil dizer que depois de muitos sacrifícios e
dificuldades, o filme foi estreado. Eu próprio apareço nele, de chapéu e
bastante favorecido na idade. São quinze minutos da melhor animação,
que o público tem aplaudido em salas e festivais de cinema, como foram,
no passado recente, os casos de Japão e Alasca. Como foi igualmente o
prémio que acaba de lhe ser atribuído no Festival de Cinema Ecológico de
Tenerife, felizmente ressurgido de uma paragem forçada de alguns anos.
Chelo veio a nossa casa, trouxe-nos o prémio, uma escultura
representando uma planta que parece querer ascender até ao sol e que,
muito provavelmente, irá continuar a sua existência na Casa dos Bicos,
em Lisboa, para mostrar como neste mundo tudo está ligado a tudo, sonho,
criação, obra. É o que nos vale, o trabalho."
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